Luanda: CIALP no Fórum de Infraestruturas em África

Luanda | Nos passados dias 29 e 30 de Abril, Luanda acolheu no Centro de Convenções de Talatona o 2º Fórum de Investimento em Infraestruturas Urbanas em África (www.auiif.com), uma organização da revista African Business, da IC Events, da UCLGA (United Cities and Local Governments of Africa) e do Governo de Angola. O Fórum contou com o apoio institucional do CIALP e da Ordem dos Arquitectos de Angola.

A convite da organização, o Presidente do CIALP participou como orador convidado no painel dedicado a “Nova Urbanizações e Desenvolvimentos”, apresentando comunicação intitulada “Da Cidade às Infraestruturas Urbanas”.
Transcreve-se, de seguida, o respectivo conteúdo:

“As Cidades são a face mais visível e extraordinária da aventura humana na nossa terra comum. Onde maior número de pessoas habitam e coabitam, onde maior complexidade social existe, onde mais trocas de todos os tipo sucedem, onde maior riqueza é produzida, onde a invenção e o intercâmbio cultural e científico mais acontecem, onde a liberdade e a expressão da diferença são mais possíveis.
As Cidades são, também, o último refúgio de esperança e de solidariedade para tantos e tantos que insistem em nelas viver ou a elas acorrem, hoje mais de 50% da população mundial, entre a vontade de felicidade e a esperança de uma vida melhor.
Contudo, nunca como hoje foram tamanhos os desafios colocados às cidades. Desafios, desde logo, na sua própria definição e alcance, entre grandes metrópoles e cidades pequenas ou médias, entre cidades formais e cidades difusas, ou na interacção entre cidade e campo. Desafios, também, na gestão eficaz dos recursos disponíveis para investimento, em maior sustentabilidade em termos de energia, água, alimentos, transportes e resíduos, e, acima de tudo, na procura de uma vida decente para o maior número de cidadãos, com habitação, equipamentos e espaço público condignos, com acesso ao trabalho garantido e com possibilidade de lazer.
Dir-se-ia que o mundo está hoje, como nunca antes, profundamente dependente das cidades como seu destino e do próprio destino das cidades. E que, por isso mesmo, as cidades constituem hoje uma nova oportunidade para a humanidade ou, porventura mesmo, a sua derradeira oportunidade.

Neste contexto preciso, as cidades do continente africano não constituem excepções, ainda que os respectivos desafios possam ser particulares, maiores ou porventura mesmo mais problemáticos. Também aqui, entre a norma e a diferença, cada cidade é um corpo análogo a outros e, em simultâneo, um caso particular.
Entenda-se por norma o carácter ou as características análogas ou complementares que aproximam umas em relação a outras e que lhes permitem reconhecer-se em rede.
E entenda-se por diferença, tudo aquilo que distingue umas de outras, seja pela geografia, seja por consequência do passado e do presente em histórias e culturas urbanas próprias, seja pela criação de expectativas diferenciadoras de futuro, consolidando identidades urbanas específicas.
Creio que é exactamente este binómio entre cooperação e diferença que deve informar e potenciar a reflexão sobre a cidade africana contemporânea. Falo obviamente da necessidade de equacionar a cidade como destino, ou seja, como Projecto. Uma cidade que permita equacionar-se na antecipação daquilo que ainda não é, mas que deseja vir a ser e pode vir a ser. Uma cidade que, para além de acudir às urgências e contingências do presente, seja capaz de projectar-se no devir. Uma cidade que permita reconhecer-se na diferença – a legada e a futura – para afirmar-se identitariamente tanto em rede com outras cidades complementares, quanto num quadro de inevitável competição com as demais.
Na verdade, ainda que as cidades africanas convivam hoje num mundo forçado ao pragmatismo do capitalismo global, não é por serem semelhantes entre si ou às dos outros continentes que são mais atractivas. Bem pelo contrário. É a diferença que potencia a respectiva singularidade por poder trazer consigo memória, especificidade, conhecimento, especialização, invenção ou inovação únicas, ou seja, identidade. E esta identidade deve significar organização e inclusão, pois uma cidade fisicamente mais organizada e inclusiva dinamiza civilidade e economia urbanas, atrai mais facilmente investimento, diminui custos futuros de infraestruturação, equipamentos e espaço público, e facilita sustentabilidade e competitividade.

Ora, a ser certa esta perspectiva, é neste contexto que creio ser pertinente abordar e equacionar o papel das “Novas Urbanizações e Desenvolvimentos” na cidade, desde logo das grandes infraestruturas, sejam as redes urbanas enquanto sistema circulatório (vias, abastecimentos e recolhas), sejam os grandes equipamentos urbanos enquanto órgãos principais do corpo da cidade (aeroportos, estações intermodais, hospitais, universidades, instituições, complexos desportivos, etc).
E porquê?
Porque, para além da sua função estrita, encerram o enorme potencial de serem instrumentos e agentes de transformação e de construção da diferença a partir da cidade existente, desde logo pela respectiva escala. E, também, porque diante de um quadro que é sempre de escassez diante dos desafios a enfrentar e dado serem quase sempre fruto de avultados investimentos do Estado (ou coordenados ou regulados a partir deste), implicam a obrigação pública em potenciá-los no maior bem comum possível.
Podem gerar oportunidades de espaço público, de revitalização urbana, de conexão entre formal e informal, de sedimentação do disperso ou do desfigurado, de reorganização do edificado, de diminuição do desagregado ou do segregado, ou até mesmo de criação de novas polaridades urbanas, com consequências directas na melhoria do ambiente construído e da qualidade de vida dos cidadãos. Podem mesmo ser geradores de habitação para o maior número, desde logo crucial para a inclusão e coesão sociais, ajudando na difícil gestão do solo disponível e tirando partido da sua presença física para desenhar nova cidade ou redesenhar a cidade existente, diminuindo segregação e aproximando-as de todos os cidadãos. Aliás, a nova habitação deve sempre desenhar cidade e não segregar-se desta.

Sei bem que este caminho para as grandes infraestruturas urbanas enquanto agentes centrais de diferença e transformação identitária não é fácil. Contudo, ao desafiarmos o óbvio, o hábito ou a conformidade, estaremos um pouco mais perto da oportunidade de construir devir, de afirmar identidade, de concretizar a cidade africana como destino de humanidade, enquanto algo que constrói o hoje em função do amanhã, optimizando o reconhecível, antecipando o adivinhável e forçando o ambicionável. Uma cidade de civilidade e inclusiva, de encontro e de invenção da diferença, galvanizadora dos cidadãos e de todos quantos nela actuam.
Ora, passar da reflexão à acção depende de cada um de nós, da crescente capacitação de todos os intervenientes e da melhoria do capital humano para atender, não necessariamente às necessidades do mercado, mas sobretudo às necessidades da cidadania.
E se assim for, no final de tudo, em cada Nova Urbanização ou em cada Novo Desenvolvimento da cidade, serão sempre as pessoas que importam, entregando-lhes mais esperança e ajudando-as no seu direito à felicidade”.

João Belo Rodeia
Presidente do CIALP

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